quinta-feira, 2 de dezembro de 2010

A FOLHA

         
          Não sei exatamente quando nasceste, mas imagino que tenha sido numa noite calorosa e boemia perto de mim. Quando outras tentaram florescer, você apareceu e conseguiu despertar algo que há muito não existia. Mas, inexplicavelmente, você desaparece do arvoredo, e logo ressurge para reafirmar suas palavras. Com leveza e insistência consegue o meu perdão, não tão difícil, pois o teu verde já havia atingido a minha sensibilidade. Então, conduzido por uma energia que se misturava a desejo, fui até o centro de um lugar. Sua paz e gestos me afirmavam que tudo aquilo já valia a pena. E assim, se sucederam os dias, na mais plena harmonia e perfeição. Porém, numa noite sombria vimos tudo cair por terra, fomos de um extremo a outro, extremo este que nos tornou tão opostos e diferentes. Eu não conseguia entender como aquela folha tão viva, verde e bela, começava escurecer como a noite cheia de nuvens negras que nos cobria.

          No outro dia, quando achava que tudo seria refeito, te encontro caída naquelas águas geladas, sua cor já não mostrava tanta vivacidade, mas senti você tocar meu corpo e percebi com a máxima sensibilidade que tudo havia mudado. Eu não aceitava, nem queria acreditar naquela realidade. Tentei te reanimar, aumentei as doses de carinho, te coloquei junto ao meu peito, com a finalidade de te fazer ouvir o som que mais gostava. Ah minha folha! Como eu quis trazê-la de volta àquela vida que em pouco tempo eu me adaptei. Aquela efêmera troca de carinhos e pseudônimos amorosos deu um nó na minha cabeça e o coração ficou apertado, mas não deixou de bater, não só para dar continuidade a vida do corpo, mas a vida do que vai além da matéria, do que é invisível aos olhos.

          Num descuido, da noite para o dia, quando senti falta de toda aquela virilidade, notei que você havia secado dentro de um porta-luvas, contudo, não foi pela ausência dos meus cuidados e carinhos, mas por decisão sua, talvez por não querer se dar o trabalho de exercer o perdão, ou simplesmente por não conseguir ver que além das nuvens havia um sol que brilhava acima delas e essa luz era o mais importante de tudo. Quero ter a lembrança dos dias em que era uma folhinha verde, tão viva e meiga como a rosa do pequeno príncipe, assim como eu, queria tê-la como única, por mais que existissem tantas outras mil rosas. Creio que o mesmo tempo que te fez nascer, cair, secar e desaparecer possa trazê-la de volta, pois agora já identificamos onde estão os espinhos que nos sufocaram, e com sabedoria poderemos retirá-los, sem nos ferir, nem comprometer nossas personalidades fortes de âmago sensível.


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